Desenvolvimento Comunitário

Comunidade da Ilha Olinda coagida a abandonar as suas terras ilegalmente

A comunidade da Ilha Olinda, no Posto Administrativo de Mucupia, Distrito de Inhassunge, Província da Zambézia continua a viver em clima de insegurança e medo, sendo forçada a deixar as suas terras, na base indemnizações arbitrárias, impostas à força.

Perante a ausência de qualquer acordo com as autoridades oficiais, que concessionaram as terras daquelas comunidades a uma empresa chinesa, para a exploração de areias pesadas, as autoridades têm estado a obrigar os camponeses a abandonarem as suas áreas, que vão sendo ocupadas à força pela empresa chinesa, Africa Great Wall Mining Development Company, escoltada por agentes da Unidade de Intervenção Rápida (UIR)

Uma equipa de pesquisa do SEKELEKANI, que regressou ao local recentemente, recolheu informações que desenham um quadro de flagrantes violações à lei e de terror, imposto com recurso a força policial.

Às vezes os camponeses são surpreendidos por maquinas limpando suas machambas

Autoridades impõem “indemnizações” unilateralmente calculadas

No dia um de Março passado, o Chefe da Localidade de Cherimane, acompanhado de representantes da Administração de Mucupia e da empresa Africa Great Wall, deslocaram-se à Ilha ,com o intuito de reunir com a população para falar de indemnizações que seriam pagas às famílias para abandonarem as suas terras, entretanto concedidas para a exploração das areias pesadas.

Como não há ainda acordo sobre o local para onde estas famílias vão ser reassentadas, elas não foram à reunião, temendo voltar a sofrer as cargas policiais que lhe foram infringidas em Julho do ano passado, devido ao mesmo problema.

“Ninguém saiu de casa para o local do encontro”, contou ao SEKELEKANI um dos residentes da ilha, pedindo anonimato por medo de represálias.

Nesse mesmo dia, desembarcou na ilha uma equipa da empresa chinesa, trazendo consigo o seu batelão, com tractores, uma maquina escavadora, um caterpilar e materiais de construção, entre chapas de zinco, pedregulhos e pedra. E iniciaram imediatamente a construção de estaleiros e casas. O estaleiro foi montado em terras de famílias locais, sem o seu prévio consentimento nem informação.

A partir daí, agentes das autoridades administrativas locais, acompanhados de representanes da empresa chinesa e de agentes armados da UIR, começaram a andar de casa em casa, obrigando os residentes a aceitar quaisquer valores monetários, contra a assinatura de documentos cujo conteúdo desconhecem, alegando tratar-se de “indemnizações”. Ninguem sabe que tipo de bens estão a ser “indemnizados”, nem que tipo de tabela é usada, ja que não houve qualquer registo de propriedade junto das famílias.

De acordo com “João”, residente da ilha, as indemnizações variam entre 300,00 a 5.000,00 Mts. (trezentos a cinco mil meticais ) por família. As autoridades levam consigo uma única lista com nomes dos chefes dos agregados famílias. Ao entrarem numa casa procuram confirmar o nome e mandam-no assinar o papel, entregando a seguir um valor não negociado com a família em causa.

Segundo conta João, neste exercício arbitrário e intimidatório, não é dado tempo, sequer , de ler o que vem escrito na folha que deve ser assinada. E ninguém se atreve a recusar ou questionar, perante militares armados.

Em alguns casos, a empresa chinesa simplesmente invadiu machambas de camponeses, destruindo suas culturas, na sua ausência. sem qualquer pré-aviso. Este é o caso de “António”. Ele conta que a sua casa foi invadida por militares, na companhia de chefes administrativos locais e trabalhadores da empresa chinesa, que queriam falar com ele.

“Alguém da comunidade ligou-me a alertar que minha casa tinha sido invadida por agentes da empresa chinesa, escoltados por agentes armados da UIR (Unidade de Intervenção Rapida). Quando cheguei a casa, os chineses já tinham descarregado seu equipamento na minha casa: chapas de zinco, ferros… e estavam sentados em cadeiras, na minha machamba de arroz” conta António.

Usurpação de terra cria conflitos familiares

Uma vez no seu terreno, o chefe da localidade ainda perguntou ao António se ele autorizava que suas terras fossem cedidas à empresa chinesa, tendo este simplesmente respondido que não tinha nada a dizer, pois os chineses já se tinham instalado no seu terreno.

Esta invasão causou mal-entendidos e revolta entre os membros da família de António , que o acusaram de ter tomado uma decisão unilateral, de ceder as aquelas terras sem o consenso da família.

Quando a filha de António, residente em Quelimane, procurou esclarecimentos junto das autoridades da Localidade de Cherimane, foi-lhe oferecida o o valor de 500,00 Mts (quinhentos Meticais) como suborno para …”encerrar o caso”, o que ela recusou.

Um outro residente local, “Micas”, contou ao SEKELEKANI que na altura da chegada da empresa chinesa à ilha, com representantes administrativos locais, ele estava ausente, na cidade de Quelimane. Quando do seu regresso, a mulher contou que lhe tinham entregue um valor de 2.000,00 (dois mil meticais) ,como indemnização por suas duas machambas. Como ela não sabe escrever, eles recolheram as suas as impressões digitais sobre a lista dos indemnizados.

“Com esse valor, eles estão a pagar tudo: as machambas, as culturas e as árvores de fruta que eu plantei ai!”, desabafa Micas

“Indemnização” para justificar uso de violência

A Ilha Olinda está isolada, sem vias de acesso por estrada até à localidade de Cherimane, ponto mais próximo para embarque de canoa . A motorizada é o único meio de transporte usado de Recamba – Inhassunge a Cherimane, um percurso de 37 quilómetros.

A única via que liga Recamba a Cherimane

A população local reclama não apenas pela usurpação das suas terras, mas também por falta de comunicação por parte das autoridades administrativas locais sobre a zona onde ela será reassentada, pois a primeira que lhes foi indicada não possui terras férteis, nem rio.

“Não nos dizem quando iremos sair e nem onde seremos reassentados. No ano passado fomos violentados porque não concordamos com a zona para onde nos queriam enviar, porque as terras não são férteis e não há rio próximo da zona”, conta Luís.

Os camponeses de Olinda temem que, com base nas falsas indemnizações que lhe foram impostas, as autoridades voltem a usar a violencia policial, para as obrigar a abandonar as as suas terras.

Um residente lembra que quando as autoridades e a UIR entraram, pela primeira vez na Ilha, a população foi violentada de tal forma que ainda hoje tem sequelas. “ A nós nos surpreenderam na travessia, a sair de canoa de regresso a casa. Os agentes da UIR agrediram-nos, arrancaram-nos nossos telemóveis e obrigaram-nos a entrar no rio. Eu fiquei ferido no braço de tal sorte que ainda hoje ferimentos”, conta uma das vitimas, mostrando marcas de ferimentos causados pela violência brutal de Julho de 2018.

 

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