Desenvolvimento Comunitário

Reassentamento chinês cria discórdia em Angoche

O governo distrital de Angoche e a empresa chinesa Haiyu Mozambique Mining estão de costas voltadas, devido a desentendimentos sobre a qualidade das casas de reassentamento, que a mineradora de areais pesadas está a construir para as famílias desalojadas da aldeia da localidade de Thôpa.

Trata-se de casas para o reassentamento de nove famílias que, em 2018 foram retiradas das suas zonas de origem para dar espaço à extração de areias pesadas, e alojadas provisoriamente em habitações arrendadas, com precárias condições de habitabilidade.

Entretanto, após a seleção do empreiteiro, apurado em sede de concurso público aparentemente polémico, o governo distrital terá enviado à empresa chinesa uma carta com um orçamento de 2.200.000 MTs (dois milhões e duzentos mil meticais) como custo de construção de cada casa, perfazendo um total de 19.000.800,00MTs (dezanove milhões e oitocentos mil meticais) para as nove casas.

Entretanto, a empresa Haiyu rejeitou este orçamento, alegando que apenas tinha capacidade para pagar 1.450.000,00 MTs (um milhão quatrocentos e cinquenta mil Meticais) por cada casa. Por seu lado, o governo rejeitou a contraproposta da mineradora chinesa, considerando tratar-se de prenúncio de construção de casas sem qualidade.

Em declarações ao SEKELEKANI, o Director dos Serviços Distritais de Planificação e Infraestruturas, Arnaldo Anselmo, disse que o governo reprovou aquela contraproposta de orçamento porque a mesmo significava que as casas “vão ser erguidas sem pilares nos cantos e sem vigas suficientes, segundo mandam as normas de construção civil”. Em consequência deste desacordo, o governo distancia-se das obras e, consequentemente, da sua fiscalização, acrescentou.

De acordo ainda com o governo distrital, a empresa Haiyu Mining está a violar o Decreto 5/2016 de 8 de Março, (Diploma Ministerial de Contratação de Empreitadas e Prestação de Serviços) que estabelece as normas de construção civil, determinando a obrigatoriedade de descrição em placa, de toda a informação relativa à construção da obra, nomeadamente, o número da licença, o número do alvará, o dono da obra, o empreiteiro, o fiscal e o correspondente custo daquela.

Placa de identificação incompleta da obra…sem fiscal!

Pelo tom destas declarações, tudo leva a crer que o governo distrital conformou-se com as posições da mineradora, quer relativamente a recomendações para a construção de casas com qualidade, quer quanto aos ditames da lei sobre a publicidade da natureza e dos intervenientes directos da construção de qualquer obra.

A reacção da Haiuy Mining

Por seu lado, a mineradora chinesa diz-se agastada com o governo distrital de Angoche, ao qual acusa de sempre colocar-lhe entraves aos processos de implementação de seus  projectos de responsabilidade social.

Segundo conta o Director-Geral da empresa, Juyi Li, mais conhecido por “Francisco”, o concurso para a construção daquelas casas foi lançado unilateralmente pelo governo distrital, sem aviso à empresa e à comunidade afectada. De igual modo, a selecção dos concorrentes terá sido feita sem a presença da mineradora, da comunidade e de representantes da sociedade civil.

O gestor afirma ainda que, depois do lançamento do concurso e  selecção dos empreiteiros  pelo governo distrital, a empresa tomou a iniciativa de convidar todos os empreiteiros concorrentes para dois encontros realizados na cidade de Nampula, onde explicou que não tinha como suportar o orçamento de 2.200.000, 00 MT para a construção de cada casa, mas poderia, sim, pagar por custo de cada casa, o valor de 1.200.000,00 MT.

Nos encontros, alguns empreiteiros que tinham ganho o concurso, recusaram a contraproposta da mineradora, insistindo no orçamento de 2.200.000,00 MT. Porem, outras aceitou a nova proposta no valor de 1.450.000,00 MT por cada casa. Entre estas, incluem-se, precisamente, a GUMA Builder E.I e a ACC Construções, as quais não haviam sido apuradas na primeira volta.

De acordo com o director da Haiyu, a empresa criou todas as condições para o início das obras, marcado pelo lançamento da primeira pedra, onde foram convidados o governo distrital, o conselho municipal, a comunidade, a sociedade civil e a media.

“Com a data de lançamento da primeira pedra marcada e confirmada, à última hora, o governo distrital e o conselho municipal faltaram à cerimónia. Não restava mais nada senão fazer o lançamento e avançar com as obras ”, justifica-se “Francisco”.

Em sua defesa, o gestor alega que “uma parte da sociedade civil e algumas comunidades agora começam a perceber que a empresa quer levar avante os projectos, mas não tem avançado por conta da demora e da burocracia a que tem sido sujeita pelas autoridades”.

Xu Ying, director-adjunto da Haiyu Mining, afirma que,  por vontade das famílias deslocadas, as casas foram construídas a 500 metros do local de onde foram retiradas para dar espaço à mineração das areias pesadas. Portanto o reassentamento foi feito dentro do espaço concessionado à empresa. Devido a esta reocupação de espaço, a empresa deverá fazer a desanexação da área de reassentamento para de seguida iniciar-se o processo de atribuição de Direito de Uso e Aproveitamento da Terra (DUAT) às nove famílias beneficiárias.

 Famílias satisfeitas

Entretanto, alheias ou desconhecedoras dos desacordos entre o governo distrital e a empresa chinesa, sobre a qualidade das casas em construção, as famílias beneficiárias mostram-se satisfeitas com as mesmas, comparando-as com a precariedade daquelas em que têm estado a viver provisoriamente, desde Setembro de 2018. A dimensão das casas, de 10 metros quadrados em media, com três divisões, agradam a maioria das famílias beneficiarias. Momade Bachir, um dos beneficiários, diz que este modelo “é o melhor que existe em Thopa e será adequado para si, esposa e filha. Em particular, agrada-lhe saber que a casa inclui uma cozinha e casa de banho.

Uma das casas de reassentamento em construção

Por seu lado, a anciã Fátima Cassimo, também beneficiária, diz estar satisfeita por ver a empresa chinesa a cumprir com a promessa. “Apesar da demora, estou satisfeita porque mesmo que um dia eu venha a perder a vida, os meus filhos vão herdar a casa”, diz a anciã, que vive apenas com um neto, uma vez que todos os filhos sendo adultos e casados, vivem em suas próprias casas.

Segundo Fernando Samuel, encarregado de obras da empresa GUMA Builder E.I, a escolha do modelo das casas resultou de um encontro havido entre a comunidade, governo distrital e a empresa Haiyu Mozambique Mining Co. Lda. Elas foram concebidas para terem caleiras para a recolha da água das chuvas; porem o projecto não contempla a construção de reservatórios”, acrescenta o técnico.

Assim, construídas sem o acordo do governo e sem fiscal, a qualidade das polémicas casas de Thôpa apenas se vai manifestar com o tempo, após a sua entrega aos beneficiários. Porém, se os receios do governo distrital se confirmarem, será a segunda edição das tristemente celebres casas de reassentamento de Cateme, construídas pela empresa Vale Moçambique, na Província de Tete.

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