A Vila Carbonífera de Moatize, na Província de Tete, tem estado a ferro e fogo desde há praticamente uma semana, onde membros das comunidades locais voltaram a realizar protestos contra a mineradora brasileira Vale Moçambique, exigindo indeminizações por perdas e danos, reclamados há mais de uma década.
A nova onda de protestos começa na passada Quinta-feira, dia 6 de Maio, quando várias dezenas de populares marcharam em direcção a zonas de mineração da empresa brasileira, bloqueando as suas actividades, como forma de se fazerem ouvir.
Trata-se, no presente caso, de artesãos que, antes da entrada da Vale em actividade em Moatize, dedicavam-se ao fabrico de tijolos, para o mercado local e para o Malawi. O início da mineração ditou o encerramento das suas pequenas fábricas, ao que se seguiram promessas de justa indeminização, entretanto geridas de forma ardilosa e sem transparência, pela Vale. A informação recentemente divulgada pela Vale, sobre a sua próxima retirada da província de Tete, reacendeu as reivindicações das vítimas de Moatize, receosas de serem deixadas para trás.
Uma primeira aproximação entre as partes na Sexta-feira, levou os camponeses a observar uma trégua, na promessa de uma sessão de diálogo no dia seguinte, dia 7 de Maio, a qual haveria de transformar-se em seis horas de cargas policiais, com detenções e ferimentos de manifestantes pacíficos.
Polícia de Intervenção Rápida dispara e lança gás lacrimogéneo
A violência policial inicia quando os manifestantes recusam-se a ser separados em grupos, para dialogar com representantes do governo, exigindo diálogo aberto com a empresa brasileira. Fatima Lenade, correspondente comunitária do SEKELEKANI, que testemunhou os eventos conta o seguinte:
“Primeiro chegou a chefe das operações da FIR, que pediu cinco pessoas da comissão dos agricultores e oleiros para um diálogo à porta fechadas; mas os manifestantes reprovaram a proposta, exigindo um encontro aberto, em que todos iriam seguir e participar. Ê então que, por volta das 10 horas, chega um carro da FIR, e começa a disparar e a lançar gás lacrimogénio. É aí onde são detidas pessoas, apenas libertadas por volta das 17 horas, graças a intervenção de advogados da Liga dos Direitos Humanos”.
Nos seus protestos, os oleiros acusam o Governo de conivência com a empresa estrangeira e, após várias tentativas falhadas, de obter o apoio das autoridades governamentais distritais, eles agora não acreditam que estas possam ser interlocutoras válidas. Por isso recusaram a mediação do Governo distrital, no Sábado, exigindo diálogo directo com a Vale.
Em resposta, os peticionários, concentrados num descampado, foram surpreendidos com a chegada de uma unidade da Força de Intervenção Rápida (FIR), que contra eles disparou e lançou gás lacrimogénio, impondo a sua dispersão. Seguiram-se seis horas de tumultos, em que seis pessoas foram detidas e três ficaram feridas, incluindo uma criança hospitalizada em estado grave, vítima de uma bala perdida, que atingiu a menor na zona do joelho.
Na sequência destes protestos, Fátima Lenade, correspondente comunitária do SEKELEKANI em Moatize foi alvo de actos intimidatórios, por parte da FIR e do Presidente da Vila Autárquica de Moatize, Carlos Portimão. Eis o relato dela: “Eu mesma fui vítima de ameaças por parte de agentes do governo distrital e da FIR.. Quando a FIR apercebeu-se que eu estava a gravar e fazer fotos, seus agentes arrancaram-me o telefone celular. Fui atrás, mas para agravar, o Presidente da Autarquia da Vila de Moatize, Carlos Portimão, apareceu e obrigou-me a mostrar-lhe as imagens e ele apagou-as. Perguntou-me se era da sociedade civil e ameaçou levar-me para o Comando Distrital da Policia, tendo desistido dos seus planos quando aproximou-se um advogado conhecido, que me defendeu”, conta a Fátima.
Vítima de balas perdidas abandonado no Centro de Saúde
Além da menor alvejada na região do joelho, um outro residente local, de nome Vasco Jacinto, foi também vítima de bala perdia, que o atingiu ao chegar em casa, regressando do trabalho. Tal como a menor atingida, Vasco também não estava envolvida nas manifestações. A bala perdida atingiu o Vasco na barriga e ele foi levado ao Hospital de Moatize por agentes da empresa Vale Moçambique, que no entanto jamais quis prestar-lhe qualquer assistência. A família, desprovida de meios, tem estado a pedir ajuda, para garantir diariamente quatro frascos de ampolas, custando cada uma 70 meticais.
A chegada da FIR surge na sequência da recusa por parte da comunidade de dialogar com os representantes do governo, exigindo negociação directa com a Vale Moçambique.
Fátima Tores, conta que, “primeiro chegou a chefe das operações local que pediu cinco pessoas da comissão dos agricultores e oleiros para um diálogo a porta fechadas, mas eles negaram, alegando que todos os agricultores e oleiros deveriam ouvir tudo que fosse dito na reunião. Então as 10 horas chegou um carro da policia (FIR), que disparou e lançou gás lacrimogénio“ .
As seis pessoas detidas só foram soltas por volta das 17 horas, graças a intervenção dos advogados da Liga dos Direitos Humanos, que para além de ajudar na soltura dos detidos interveio quando o governo local perpetuava ameaças a população, explica Fátima Torres.
“Eu mesma fui vítima de ameaças por parte do governo. Na sexta-feira, quando chegou FIR apercebeu-se que eu estava a gravar e fazer fotos, arrancaram-me telefone. Fui atrás e depois o presidente Carlos Portimão me obrigou a abrir e viu as imagens. Ele apagou e queria me levar para comando, viu que o que estava no telefone e disse afinal você é da sociedade civil? Foi quando chegou um advogado de nome Moio e defendeu-me chamou próprio presidente conversou com ele“ acrescentou.
Vítima de Bala perdida deixada a própria sorte
De acordo com a família, vasco Jacinto foi vítima de bala perdia enquanto chegava a casa vindo do trabalho, não fazia parte do grupo que estava a monte para reunião.
A bala perdida atingiu Vasco Jacinto na barriga e encontra-se internado no hospital de Moatize, sem assistência por parte do governo e nem da Vale Moçambique.
A empresa Vale Moçambique, levou ele apenas para o hospital e desde não tem dado nenhuma assistência. A família pedi ajuda pois não consegue arcar com as despesas médicas.
“Precisamos diariamente de quatro frascos de ampolas por dia e cada custa 70 meticais. Estamos preocupados, não temos visita da empresa e nem do governo para dar assistência“ disse Betinho familiar da vítima.
Negociações com a Vale marcadas param a Quarta-feira
Entretanto, na sua ação, a FIR visou atingir em particular os membros da comissão dos agricultores de Moatize, que os classifica como “agitadores”, por liderarem os protestos. Para se protegerem, alguns membros da comissão viram-se obrigados a esconder-se em locais seguros.
“Na quinta-feira, uma brigada da Policia fez plantão na minha residência e senti-me obrigado a me esconder. Tive que fugir de casa por volta da meia-noite, só regressando no dia seguinte, quando recebi uma chamada da administradora do distrito, Maria Torcida apelando a calma e garantindo que eu estava seguro”.
Entretanto, e de acordo com porta-voz da comissão dos agricultores de Moatize, Tomo João Tomo, foi acordado que a comunidade, Vale Moçambique e governo local vão reunir esta Quarta-feira negociar, procurando um acordo que acomode os direitos de indeminização dos oleiros, nos termos da lei.